Sunday, April 15, 2007

Cuidado ao dizer, no Rio de Janeiro: "Quero umas bolachas."



No intervalo de um curso que eu ministrava para professores no Rio de Janeiro, enquanto tomava café com os participantes, todos cariocas, comentei que estava com vontade de umas bolachas. Uma das participantes riu e disse que, no Rio, bolacha quer dizer tapa, tabefe. Nessa ocasião, o contexto me livrou de levar umas bofetadas, pois diante da situação, todos entenderam que eu me referia aos biscoitos (palavra usada pelos cariocas para designar as bolachas dos paulistas) e não a algum desejo masoquista de apanhar! Cruzes! Ainda bem! :-)
Biscoito e bolacha são a mesma coisa do ponto de vista gastronômico, embora em São Paulo tenhamos biscoito de polvilho mas não bolacha de polvilho! Acho que os de formato achatado costumamos chamar de bolacha, mas isso não é regra.
Em inglês, temos cracker (geralmente um quadrado ou retângulo de massa assada crocante e salgada) e cookie (geralmente redondo e doce).
Em inglês, a palavra cracker é usada figurativamente para designar também a) uma pessoa pobre e branca ou b) uma pessoa pobre, branca, habitante da zona rural, geralmente do sul dos EUA.
O termo é pejorativo e causa ofensa à pessoa assim designada.
Embora eu achasse que a metáfora derivasse da associação entre a cor da bolacha e a cor das pessoas dessa região, na verdade, a origem é outra. O excelente Online Etymology Dictionary me ensina que cracker deriva, nesse caso, do verbo crack, de origem escocesa, que significa gabar-se, vangloriar-se. Segundo o dicionário, em citação de G. Cochrane, datada de 1766, os crackers receberam esse nome por serem considerados à época, “…grandes contadores de vantagem*; um bando de pessoas desonestas, sem lei, de moradia incerta e habitantes das fronteiras da Virgínia, Maryland, Carolinas do Norte e do Sul e da Geórgia.”
(*ou gabolas, como se dizia antigamente – segundo ouvi dizer! ;-)
Cracker em português, no sentido b) acima, poderia ser traduzido como capiau, termo pejorativo para designar os originários ou habitantes das áreas rurais no Brasil. A palavra capiau vem do guarani e tem diferentes correlatos nas diversas regiões do país.
Em português, cracker no sentido a) acima seria branco azedo, branquelo.
Lembrem-se de que referir-se a uma pessoa como cracker em inglês ou em português como capiau, branquelo ou branco azedo é ofensivo e preconceituoso. São palavras (e idéias!) a serem evitadas sempre, portanto.
O mesmo vale para nigger (em português, crioulo), que nunca deve ser usada para designar pessoa negra em inglês. Nos EUA, os termos politicamente corretos são Afro-American ou black. No Brasil, usa-se afrodescendente ou negro e evita-se a palavra preto, considerada ofensiva.
Segundo leis brasileiras, dirigir-se a alguém com palavras ofensivas em relação à cor da pele é punível por lei, constituindo crime inafiançável.

5 comments:

Elisa Kerr said...

Olá Ana,

Sou do estado Estado do Rio e moro em Sampa à mais de 20 anos. Sempre que algum paulista me oferece bolacha, respondo: - não sou mulher de malandro para gostar de bolachas! Gostei muito de sua explicação sobre os biscoitos e ... A propósito, verifique se você acha a palavra bolacha nas embalagens de biscoitos. Se encontrar, por favor, me responda.
Parabéns seu blog é excelente!
Profª Elisa Kerr – CAAM – USJT

Ana Scatena said...

Elisa,
Obrigada por me honrar com sua visita e elogios ao blog. Vindos de uma professora, valem muito!
Adorei a maneira como você recusa bolachas (Opa! Biscoitos...).
E você tem razão, nos pacotes sempre aparece "biscoito". Inclusive, para escrever esse meu texto no Blog, fiz uma pesquisa em sites de fabricantes e descobri em um deles que, do ponto de vista culinário, não há diferença entre bolacha ou biscoito, mas que os fabricantes em questão preferem a palavra biscoito para nomera seu produto. Acho que é para evitar esse duplo sentido, não?
Obrigada novamente e volte sempre!

Valner Saia said...

Na Capital Nacional do Alimento (Marília-SP), existe diversas fábricas de bolachas doces e salgadas e também de biscoitos de polvilho. Nossas embalagens foram alteradas pois o estado do Rio de Janeiro é um forte consumidor e isto chama-se Marketing de Produto. Sendo assim a Mabel, Marilan, Dori, Bel, etc são grandes produtoras e exportadoras de Bolachas doces, recheadas e de água e sal.

Anonymous said...

Aqui em Minas existem bolachas e biscoitos, vai saber.

Ana Scatena said...

Hahahaha... Boa, Diego! Problema existencial!