Thursday, October 29, 2020

Halloween não é o Dia das Bruxas!

Em 31 de outubro muitos países de língua inglesa celebram o Halloween. No Brasil a data começou a ser comemorada nas escolas de idiomas e hoje em dia está mais disseminada, apesar da crítica ao fato de ser uma festa "importada" dos Estados Unidos.
Na realidade, existe uma tese que afirma que essa festa tem origem nos povos Celtas  [em inglês, Celts] da Escócia e Irlanda, antes de Cristo. Quando houve uma escassez de batatas na Irlanda, os que fugiram da fome emigrando para os Estados Unidos, levaram sua tradição para lá.
Os antigos romanos também a comemoravam, e os cristãos, desde o século I,  têm uma data semelhante, que é o Dia de Finados (2 de novembro, data universalizada no século XI; All Souls' Day, em inglês), para celebrar os que já se foram desta vida.
Se analisarmos o nome Halloween, veremos que essa festa reúne o Dia de Todos os Santos (1o. de novembro; All Saints' Day em inglês) e o Dia de Finados (2 de novembro) dos cristãos, pois Halloween significa Véspera do Dia de Todos os Santos (All Hallows Eve = Eve of All Saints) e é um tributo aos mortos. A palavra hallow significava, antigamente, pessoa consagrada ou santo e objeto sagrado ou mágico. Hoje em dia, é usada como sinônimo de abençoar, santificar, consagrar.  Nessa data os povos Celtas celebravam o fim do outono, de abundantes colheitas, e o início do difícil inverno, um período de escuridão e privações no hemisfério norte. Essa data era, portanto, a passagem de ano para eles, que atualmente comemoramos em 31 de dezembro, na festa chamada Réveillon, palavra de origem francesa que significa acordar (em inglês,  New Year's Eve, ou simplesmente, New Year's). Assim como em nossa festa de Ano Novo, esses povos comemoravam o fim de uma época e o início de outra, a vida e a morte. 
No México e em alguns outros  países de língua espanhola, há a Festa dos Mortos, celebrada na mesma época.

Existe um movimento no Brasil para dar à data de 31 de outubro uma feição mais brasileira, comemorando o Dia do Saci. Acho a ideia divertida pois, como leitora contumaz de Monteiro Lobato, aprendi a amar essa personagem do nosso folclore. Contudo, o Saci é uma personagem traquinas e alegre, que prega peças fazendo tranças nas crinas dos cavalos, mas não tem relação nenhuma com a celebração dos mortos. 
Assim, acho que a data escolhida para o Dia do Saci não foi apropriada. Halloween é a celebração da morte, para que nós, os vivos, lembremos da nossa finitude. E o Saci é pura vida e remete à infância. Além disso, o Saci é uma lenda importante demais no nosso folclore e deveria ter uma data só dele, sem relação com o Halloween. 
É importante ressaltar, no entanto, que existe uma característica semelhante entre o Saci e seu hábito de pregar peças nos viajantes das florestas e de assustar crianças, e a tradição do Halloween, 
quando as crianças se divertem muito, pedindo doces nas casas. Quando não são atendidas, pregam peças nos moradores (viram latas de lixo, jogam papel higiênico nas árvores e ovos nas portas). Esse é o costume chamado trick-or-treating (travessuras ou gostosuras, como já foi traduzido o termo em alguns filmes.)
No Brasil havia uma tradição semelhante no Dia de Cosme e Damião (27 de setembro). Na minha infância dávamos doces para as crianças pobres nesse dia, que passavam pedindo guloseimas para os Santos Cosme e Damião. Hoje essa tradição resiste em pouquíssimos lugares.

Chamamos o Halloween de Dia das Bruxas no Brasil, e quem comemora a data se fantasia com temas ligados à bruxaria, à morte, ao medo, mas essa interpretação é parcialmente equivocada. Nos países em que a festa é celebrada tradicionalmente, as pessoas usam todos os tipos de fantasias (marinheiro, bailarina, esqueleto, etc, como em nosso Carnaval). É uma festa divertida, como o Dia dos Mortos no México e como nosso Carnaval, com comidas, bebidas, fantasias e muita alegria.
O Saci se aproxima dessa interpretação equivocada do Halloween como um dia de bruxarias por ser um ente endiabrado, mas não guarda semelhança com nenhuma das outras tradições mencionadas.

Analisando de uma perspectiva histórica, vemos que as tradições dos povos mais diversos se misturam em suas datas comemorativas. Assim, acreditar que Halloween é uma festa americana importada para o Brasil é enganoso. Nós temos a mesma data, só que celebrada de maneira diversa, em dois dias diferentes: no Dia de Todos os Santos e no Dia de Finados, festas emprestadas dos rituais pagãos com a popularização do cristianismo e, portanto, celebradas de maneira distinta do Halloween. 
Além disso, brasileiro é povo festeiro. Ouvimos "Festa!", estamos dentro! :-) Sendo assim, digo: bem-vindos sejam o Halloween, o Saci, o Carnaval, o Réveillon e tudo mais que for motivo para brincarmos e nos divertirmos! Happy Halloween! Happy Saci Day! 


Aprenda mais sobre a tradição do Halloween assistindo aos vídeos:






Clipart do fantasminha aqui.

4 comments:

Magda Almeida said...

Vivendo e aprendendo Ana Scatena, gosto de saber a origem das coisas, abs

Ana Scatena said...

Obrigada, Magda! Come back!

Marcos said...

Sabe que até entendo os que defendem que a celebração não é tipicamente brasileira, mas fico pensando se isso é realmente um problema.
Será que não seria interessante estarmos abertos para o que vem de fora? Interculturalidade é legal.
Será que não podemos, através da celebração importada, olhar para o que temos e celebrar as duas: a nossa e a deles? Seu texto vai nessa linha... gostei.

Ana Scatena said...

Oi, Marcos.
Concordo com você. O intercâmbio cultural só pode nos enriquecer. Obrigada pelo comentário e volte sempre!